quinta-feira, 28 março, 2024 19:33

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EUA vão mandar de volta para o México brasileiros que tentam atravessar ilegalmente fronteira

O governo Donald Trump publicou  uma portaria em que notifica que os brasileiros que forem pegos pelo serviço de fronteira tentando entrar nos Estados Unidos pelo México serão enviados de volta ao México para esperar pela resposta a um eventual pedido de asilo ou outros procedimentos migratórios em território mexicano.

Isso significa que os brasileiros foram incluídos no Protocolo de Proteção do Imigrante (MPP na sigla, em inglês), um programa criado no começo de 2019 com forma de reduzir o número de imigrantes ilegais no país, uma das principais bandeiras políticas de Trump.

“O Departamento de Segurança Interna começou a processar migrantes brasileiros para retornar ao México sob os Protocolos de Proteção aos Migrantes (MPP). O número de brasileiros que chegaram à fronteira sudoeste triplicou apenas no ano passado. Os Estados Unidos continuam trabalhando com seus parceiros na região, assim como em outros países, para conter o fluxo de migração irregular para os Estados Unidos”, afirma o documento, ao qual a BBC News Brasil teve acesso.

Agora, brasileiros que se entreguem ou sejam encontrados pelos serviços de Controle de Fronteira americanos serão enviados de volta ao México para aguardar a avaliação pela Justiça Americana de seu pedido de entrada. Pelo protocolo, os imigrantes brasileiros agora deverão permanecer no México enquanto durarem os procedimentos legais, o que pode levar vários meses. Quando chegar a hora de comparecer perante um juiz de imigração dos EUA, os solicitantes de asilo devem viajar de volta ao ponto de entrada da fronteira, onde serão transportados sob custódia pelos americanos. Ao final da audiência, retornam ao México, para esperar a resposta final ou uma próxima data no tribunal.

Até o mês de janeiro, brasileiros pegos na fronteira podiam ser detidos para processo de deportação ou receber uma notificação com data para comparecer ao juizado de imigração, e acabavam liberados dentro do território americano. Na prática, a grande maioria deles começava uma nova vida e jamais aparecia diante do juiz. Funcionários do departamento de controle de fronteiras afirmaram à BBC News Brasil que a convocação para o juizado funcionava como uma “notificação para desaparecer”, para os brasileiros. Agora, sem ter acesso ao território americano, eles esperam que o fluxo de imigrantes brasileiros diminua drasticamente.

Até então, o programa era destinado apenas aos imigrantes de países da América Central — Guatemala e El Salvador, principalmente. No México, os imigrantes ilegais têm enfrentado as dificuldades de viver em uma área dominada por cartéis de narcotráfico e a falta de trabalhos e recursos para se manter no país.

Os EUA pressionam desde o fim do ano passado as autoridades mexicanas para que aceitassem brasileiros em seu país. O México não queria abrigar nacionais que não falem espanhol, mas acabou cedendo. Dados do Homeland Security Department apontaram que cerca de 20 mil brasileiros cruzaram a fronteira terrestre ilegalmente no ano fiscal de 2019. É mais do que cinco vezes o número de 2018. Em dezembro, de acordo com dados obtidos pela BBC, essa tendência se manteve: quase 1,5 mil brasileiros foram encontrados na fronteira.

“O fato de os brasileiros agora fazerem parte do programa mostra que o Departamento, juntamente com seus colegas mexicanos, sempre procurou expandir o programa de maneira segura e responsável. O MPP tem sido um elemento crucial do sucesso do Departamento em lidar com a crise em curso, proteger a fronteira e acabar com a captura e liberação. O MPP continua sendo a pedra angular dos esforços do Departamento para restaurar a integridade do sistema de imigração dos EUA e aliviar o grande volume de pedidos pendentes de asilo. Nossa nação é mais segura por causa do programa”, afirma o documento do departamento de segurança doméstica americano.

O Brasil também tem sido pressionado a facilitar a deportação de cidadãos do país e tem aceitado acelerar esses trâmites. Há uma semana, um avião com cerca de 100 brasileiros deportados saiu dos EUA em direção à Belo Horizonte. “Lamento que brasileiros que foram buscar novas oportunidades lá fora voltem deportados. Lamento, mas é a política e temos que respeitar a soberania de outros países”, afirmou o presidente Jair Bolsonaro sobre o assunto.

O  Itamaraty afirmou por meio de nota que foi apenas notificado dessa alteração no tratamento aos brasileiros pelos americanos e que até o momento nenhum brasileiro enviado de volta ao México pediu ajuda ao Consulado no país. “A aplicação dos Protocolos de Proteção ao Migrante (MPP) a brasileiros apreendidos na fronteira sul dos EUA foi comunicada ao governo brasileiro pelas autoridades imigratórias estadunidenses”, diz a nota.

Brasileiros em situação de emergência no México devem contatar o consulado-geral do Brasil, que fica na capital Cidade do México. “Aquele consulado não relatou pedido de assistência consular por parte dos brasileiros enviados para Ciudad Juárez (uma das cidades fronteiriças com os EUA com maior fluxo de brasileiros). Trata-se de brasileiros que ingressaram regularmente no México e que poderão permanecer no território daquele país pelo tempo estabelecido pela legislação mexicana”, conclui a nota.

Desde que assumiu a presidência, há um ano, Jair Bolsonaro reorientou a política externa brasileira para tratar os EUA como aliado prioritário e preferencial. Como parte dessa resolução, os americanos passaram a não mais precisar de visto para entrar no Brasil, o que quebrou o princípio de reciprocidade historicamente seguido pelo Itamaraty no tema. Bolsonaro também passou a endossar as posições americanas sobre Irã, Palestina e Cuba, e facilitou a importação de trigo e etanol americano ao país.

Washington, no entanto, dá sinais trocados de apoio ao Brasil: endossou recentemente a entrada do país na OCDE, o que não tinha feito na oportunidade anterior, embora Bolsonaro já tivesse pedido ajuda a Trump, não liberou o comércio de carne brasileira em território americano, ameaçou impor tarifas sobre o aço do Brasil após acusar o governo de desvalorizar artificialmente o real — medida de que recuou. O endurecimento das medidas contra brasileiros imigrantes ilegais é um novo capítulo dessa aproximação entre os dois líderes.